domingo, 21 de outubro de 2007

Alcobaça TGV? Nao Obrigado

José Marques Serralheiro


Como cidadão, munícipe e autarca sinto-me obrigado a defender o nosso direito à indignação, de forma pró-activa.

Valdemar Rodrigues, gestor do ambiente da Alta Velocidade Ferroviária (AVF) entre Agosto de 2004 e Abril de 2005, em artigo de opinião publicado no jornal Oeste Online apresenta como uma das justificações para abandonar este projecto a seguinte: “a minha discordância quanto à razoabilidade ambiental e económica da construção de uma linha de AVF entre as cidades de Lisboa e do Porto”.

A ligação ferroviária de alta velocidade entre Lisboa e Porto – Lote C1/ Troço Alenquer (Ota) – Pombal, cuja avaliação de impacte ambiental está em discussão pública, nos traçados apresentados desventra 8 freguesias do concelho de Alcobaça (Benedita, Turquel, Évora de Alcobaça, Prazeres e S. Vicente de Aljubarrota, Cós, Alpedriz e Pataias) num percurso de cerca de 30 km, como se fossemos invadidos por uma toupeira gigante.

Temos consciência que a tarefa de resistir a esta agressão ambiental, patrimonial, cultural, histórica, social e económica é difícil, mas não é impossível.

As conclusões XXII Cimeira Luso – Espanhola, realizada em Badajoz, em 24 e 25 de Novembro de 2006, comprometem o governo português, em termos redes transeuropeias, com as ligações internacionais: Lisboa /Madrid; Porto/ Vigo; Aveiro/Salamanca e Faro/Huelva.

As terras dos monges de Cister e área de implantação do Mosteiro de Alcobaça, património Mundial da Unesco e uma das 7 maravilhas de Portugal sofre um violento sismo, quase tão arrasador como o terramoto de 1775 foi para Lisboa, o qual também abalou o nosso mosteiro.

Thomas Friedman, autor do livro fabuloso "O Mundo é Plano" afirma que é possível florescer neste mundo plano, mas é necessária a imaginação e a motivação certas”, mais adiante escreve “o mundo precisa da geração dos optimistas estratégicos, a geração com mais sonhos que memória, a geração que acorda todas as manhãs e não só imagina que as coisas podem melhorar mas também faz todos os dias qualquer coisa por essa imaginação”.

As novas gerações merecem e precisam da nossa atitude estratégica. O sonho estratégico integrado foi no passado, e continua a ser hoje, aquilo que comanda a vida, as pessoas, empresas, autarquias, regiões e os países. Não existe terceira hipótese ou construímos (inventamos), quotidianamente, o nosso futuro colectivo ou o comprometemos!

As primeiras e principais ligações do TGV: Paris / Lyon (430 km) e Paris / Bruxelas (310 km, velocidade média 221 km/h)) reduziram o tempo de percurso de 4 h / 2h e de 2 e 35m / 1h e 20m, respectivamente (redução de 50% no tempo de percurso).

À boa maneira portuguesa, mais uma vez, queremos aprender com os nossos erros, em vez de aprendermos com os erros dos outros. TGV? Não obrigado!

O tempo do trajecto apresentado para a ligação em TGV: Lisboa/Porto (313 km, velocidade média, 283 km / hora – não praticável, segundo alguns especialistas) é de 1h e 15m (solução: andar com a casa à volta). O Alfa Pendular, sem paragens, actualmente percorre esta distância em cerca de 2h e 15m. Dizem os técnicos que é possível melhorar esta performance em 30 m (solução: enroscar a lâmpada). Ficamos assim, com uma diferença de 30 m. Afinal, se acontecer esta tragédia para as populações de Alcobaça, a montanha irá parir um rato.

Se a velocidade praticada for a que se verifica, actualmente, no percurso: Paris / Bruxelas (221 km / h) o tempo do trajecto passa para 1h e 25 minutos (sem paragens) e 1h e 35 m (com paragens).

A destruição de 8 freguesias de Alcobaça e dezenas de outras está numa questão de minutos, sem evidência de mais-valias para o nosso país. A análise custo – benefício sustentada de forma sistémica em todos os factores e restrições é altamente desfavorável à ligação, por TGV: Lisboa/ Porto.

O Prof. Miguel Bogarim, catedrático de caminhos-de-ferro da Universidade de Corunha, citando o Prof. Ginés de Rus, considera indispensável para que se justifique uma linha de Alta Velocidade procuras superiores, oito a dez milhões de utentes, logo no primeiro ano (in site: http://caminhosferroaltavelocidade.planetaclix.pt)

Aprendi com Peter Drucker (o pai da gestão): “nada é mais inútil do que fazer com eficiência aquilo que não nunca deveria ser feito”.

Como se explica que um projecto, aniquilador da nossa memória individual e colectiva possa destruir sonhos, afectos e memória (estou a lembrar-me das mais de 3000 habitações destruídas e/ou afectadas, condicionando, quotidianamente, de forma directa a qualidade de vida dos seus moradores (mais de 20 000 munícipes, 1/3 da população de Alcobaça).

Em termos de solidariedade municipal podemos afirmar que todos os munícipes e visitantes deste nosso nobre território (terras de Cister) serão afectados e, por isso, obrigados a manifestar a sua indignação, de forma individual e colectiva.

Afinal de contas, o impacto económico negativo do Lote C1 na travessia do concelho de Alcobaça (30 km) pode significar uma perda superior a 360 milhões de euros (edificações, património natural e cultural, tecido económico, equipamentos sociais, empreendimentos turísticos, eco turismo, circulação de pessoas e bens, etc. (desde a decisão final até à conclusão das obras) ou seja, cada munícipe será prejudicado, em valor patrimonial, ambiental e económico em mais de 6000 euros.

Só a desvantagem socio-económica e patrimonial verificada no nosso concelho é superior ao benefício gerado pela ligação Lisboa / Porto, em TGV, nos primeiros 20 anos.

Não devemos ter dúvidas! Com esta solução perde o país e perdemos nós.

Desejo o maior sucesso e a melhor sorte na defesa desta causa aos alcobacenses. Mas atenção! A sorte dá muito trabalho. Bom trabalho!

Termino por render homenagem aos digníssimos Presidentes de Juntas destas 8 freguesias, pela irreverência e o inconformismo militantes que têm manifestado, ao serviço da garantia da manutenção da qualidade de vida qualidade dos seus fregueses. Bem-hajam, por tudo. Acreditem! Porque a razoabilidade técnica e as razões sociais, culturais, etnográficas, patrimoniais, económicas e ambientais estão do vosso e do nosso lado.

Caius Julius Caesar, (110 – 44 a C) relatava: “Há nos confins da Ibéria um povo que nem governa nem se deixa governar”. Será este o nosso desígnio? Penso que não, depende de todos, e de cada um de nós.

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